A respeito da NOTA do SINPROFAZ datada de 05/07/23, a Unafisco Nacional esclarece o que segue.
Os argumentos presentes na referida nota podem ser assim sintetizados:
- A transação tributária seria competência única e exclusiva da Procuradoria da Fazenda Nacional (PGFN) e da Advocacia-Geral da União, segundo os arts. 131 e 146 da Constituição Federal;
- O art. 8 do PL 2384/23 feriria o art. 171 do CTN;
- O art. 8 do PL 2384/23 feriria parecer normativo 03/2023;
- A Receita Federal não teria competência constitucional para realizar acordos de transação sem a participação, chancela ou autorização de um advogado público;
- Não teria havido debate suficiente;
- A transação ficaria mais complexa, com prejuízo aos contribuintes;
- O aumento de prazo de cobrança na Receita Federal prestigia o sonegador;
- Na discussão em 2020 teria ficado definido qual é o “órgão responsável por fazer a fiscalização, a autuação e o lançamento do crédito tributário; e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional é responsável pela cobrança desse crédito, inclusive na via administrativa”;
- O controle de legalidade realizado pela PGFN, inclusive nos termos da transação tributária, significa uma garantia assegurada ao contribuinte, porque é um controle suplementar da legalidade do lançamento, efetuado pela própria administração.
Passamos a apontar os equívocos dos argumentos acima enumerados:
Nos termos da nota do SINPROFAZ, a competência única e exclusiva da Procuradoria da Fazenda Nacional (PGFN) estaria fundada nos arts. 131 e 146 da Constituição Federal.
No art. 131 da CF temos a definição de que a AGU é competente para a representação judicial e extrajudicial da União, bem como para as atividades de consultoria e assessoramento Jurídico do Poder Executivo. A tal dispositivo, a PGFN pretende dar a interpretação de que todos os atos administrativos da Administração Pública só podem ser celebrados após sua aquiescência. Isso incluiria, no âmbito da Receita Federal, todas as intimações, decisões, autuações e apreensões de mercadorias. Ou seja, no entender da PGFN, a cada passo a ser dado pela administração pública e especificamente da administração tributária, a AGU/PGFN deve opinar. Facilmente podemos constatar o exagero interpretativo e a contrariedade de tal interpretação com o princípio da eficiência da administração pública previsto no caput do art. 37 da CF.
Com relação à menção ao art. 146 da CF, este dispositivo trata da necessidade de lei complementar em vários aspectos do sistema tributário. Se nessa referência quis o SINPROFAZ incluir a transação — é uma suposição, pois a Nota não está justificada a menção —, certamente podemos apontar que a lei complementar mencionada é o Código Tributário Nacional (lei complementar), notadamente em seu art. 171.
E é no art. 171 do CTN que vem a norma geral sobre a transação:
“Art. 171. A lei pode facultar, nas condições que estabeleça, aos sujeitos ativo e passivo da obrigação tributária celebrar transação que, mediante concessões mútuas, importe em determinação de litígio e conseqüente extinção de crédito tributário.
Parágrafo único. A lei indicará a autoridade competente para autorizar a transação em cada caso.”
Vale repetir o texto do CTN: “A lei indicará a autoridade competente para autorizar a transação em cada caso.”
Ou seja, ao contrário do que argumenta o SINPROFAZ, o art. 171 do CTN não está sendo contrariado pelo art. 8º do PL 2384/23, mas está a obedecê-lo ao determinar a autoridade competente para celebrar a transação antes da inscrição na dívida ativa.
A PGFN atuou para sobrepor o texto aprovado no Congresso Nacional com um Parecer, inviabilizando a transação na RFB, cuja competência foi reconhecida desde o texto original da Lei da transação tributária, Lei 13.988/2020.
O argumento de que faltaria competência constitucional para a Receita Federal realizar a transação só conduziria a um debate minimamente coerente sob o ponto de vista jurídico se a competência de toda a atuação da administração tributária tivesse como origem explícita e literal o texto constitucional. Sabemos que as competências da Receita Federal advêm do Código Tributário Nacional (lei complementar) e todo o conjunto de leis ordinárias que foram editadas pelo Poder Legislativo em harmonia com os dispositivos constitucionais. Se houvesse fundamento na interpretação da PGFN, faltaria competência constitucional para a Receita Federal emitir decisões administrativas e até mesmo lavrar termo de apreensões de mercadorias e autos de infração. Na visão do SINPROFAZ, para tudo e em todos os momentos deveria a PGFN opinar.
Ao contrário do aventado na Nota do SINPROFAZ, o conteúdo do art. 8º não previa transação sem litígio. Para os casos de ausência de litígio o PL 2384/23 traz toda uma inovação na implementação de “um modelo colaborativo entre o Fisco e o contribuinte, em benefício mútuo”, conforme muito bem apontou o relator do PL 2384/23, deputado Beto Pereira.
Ao apontar uma suposta ausência de debate, o SINPROFAZ desrespeita o trabalho do relator da matéria, deputado Beto Pereira, e de todo o Poder Legislativo, pois é exatamente o relator, exercendo seu mandato no Poder Legislativo, que tem a legitimidade política e a competência constitucional de traduzir os anseios da sociedade e avaliar a maturação de debates das matérias contidas em projetos de lei.
O SINPROFAZ, na nota em questão, demonstra que ainda atribui a qualidade de sonegador a todos os contribuintes. O aumento de prazo de cobrança administrativa não é instrumento que prestigia o sonegador, mas, ao contrário, atende ao universo de contribuintes que tiveram constituído crédito tributário por divergências interpretativas ou dificuldades momentâneas em seus negócios. A nova visão da relação fisco x contribuinte, que vem sendo adotada pela Receita Federal, privilegia a orientação e a solução célere dos litígios, sempre respeitando a imensa maioria de contribuintes que desejam cumprir suas obrigações tributárias.
O incentivo à solução dos litígios ainda antes da inscrição na dívida ativa atende ao interesse de tais bons contribuintes, pois poderão quitar seus débitos antes que estes cresçam com a incidência dos acréscimos legais de, no mínimo, 10% após a inscrição em dívida ativa.
Carece de fundamento fático e legal a afirmação de que houve, em 2020, qualquer especificação de que a Procuradoria da Fazenda é que seria o órgão responsável pela cobrança administrativa. Caberia ao SINPROFAZ apontar em qual dispositivo legal isso ficou consignado.
Defende o SINPROFAZ um controle suplementar de legalidade nos atos próprios da Receita Federal, o que, se fosse possível em nosso ordenamento jurídico, levaria ao que já apontamos acima de ser exigido para tudo, e em todos os momentos, a tutela da PGFN.
Registramos nosso respeito e admiração pelo trabalho dos advogados públicos e, em especial, dos Procuradores da Fazenda Nacional em tudo o quanto feito após a inscrição da dívida ativa e temos a convicção de que saberão dar conta do enorme desafio de administrar os muitos trilhões de estoque da dívida ativa.